A verdade por trás de um vinho falso
- Details
- Categoria: a história do vinho
Em 1985 houve um leilão de vinhos que entrou para a história. Uma garrafa de vidro verde escuro, sem rótulo, foi arrematada por nada menos que 105.000 libras, que equivaliam a aproximadamente 157 mil dólares. Era o maior preço já praticado em um leilão de vinhos!
A garrafa estava identificada, com uma escrita à mão, na qual se lia: 1787 Lafitte Th.J. Essa era a indicação de que o vinho era da remota safra de 1787, proveniente do Château Lafite, um Premier Cru de Médoc, em Bordeaux. As letras Th.J., por sua vez, indicavam que Thomas Jefferson (1743-1826) havia sido proprietário de tal garrafa.
Thomas Jefferson, um dos presidentes mais importantes da história dos EUA, era fascinado por vinhos franceses, e é considerado como o primeiro grande conhecedor de vinhos no continente americano.
O proprietário da garrafa preciosa a ser leiloada era Hardy Rodenstock. Ele dizia que esse vinho fazia parte de uma coleção de vinhos antigos, que tinham pertencido a Thomas Jefferson, e que haviam sido encontrados em uma adega, em Paris. Mas ele não dizia quem havia encontrado, exatamente onde, e nem quantos vinhos faziam parte de tal coleção.
Contudo, a garrafa havia sido analisada por especialistas da casa de leilões, que atestaram que tanto a garrafa como a escrita eram do estilo francês vigente no século 18. Além disso, era de conhecimento público que Thomas Jefferson pedia que o vinho enviado para ele, diretamente de Bordeaux, viesse marcado com as suas iniciais. Assim, tudo parecia de acordo.
Quem comprou o vinho no leilão foi Christopher Forbes, vice-presidente da conceituada revista que leva o sobrenome da família. Outras garrafas da mesma coleção foram adquiridas, depois, por outros colecionadores. Entre eles, um magnata americano chamado Bill Koch, que comprou quatro garrafas, gastando ao todo meio milhão de dólares.
Passaram-se 20 anos. Em 2005, durante os preparativos para uma exposição de artes e antiguidades do acervo de Bill Koch no Museu de Belas Artes de Boston, a curadora da Fundação Thomas Jefferson levantou dúvidas sobre a autenticidade dessas garrafas.
Bill Koch contratou um agente aposentado do FBI para investigar o caso e, também, para investigar Hardy Rodenstock, que nesse meio tempo havia se tornado um famoso caçador de vinhos raros.
Estima-se que Bill Koch tenha gasto, em todo esse processo, mais de um milhão de dólares. Ou seja, mais do que o dobro do que gastou com os vinhos, em si. Mas se tratava, acima de tudo, de uma questão de honra! Ele, que era colecionador de obras de Picasso, Renoir, Rodin, Cézanne, Monet, Miró, Dali, e Botero, entre outros, parecia ter sido enganado.
A primeira descoberta foi a falta de registros de qualquer vinho da safra de 1787, entre os mais de 60 mil documentos de Thomas Jefferson, como o diário de contas, as suas cartas, as declarações de seu banqueiro, e a papelada alfandegária francesa.
Outra suspeita. A inscrição na garrafa trazia Th.J., enquanto Thomas Jefferson costumava assinar sua correspondência utilizando dois pontos, Th:J.
Além disso, descobriram muitas garrafas vazias e uma pilha de rótulos, em um antigo apartamento de Hardy Rodenstock. De fato, até o próprio nome de Hardy Rodenstock era falso. Na verdade, ele se chamava Meinhard Goerke.
Mas as provas científicas mais contundentes ainda estavam por vir.
Philippe Hubert, um físico francês que trabalha na Universidade de Bordeaux, inventou um método capaz de testar a idade do vinho, usando raios gama de baixa freqüência para detectar a presença e a quantidade do isótopo radioativo césio 137.
Como o césio 137 não existia no nosso planeta até o advento dos primeiros dispositivos atômicos, encontrá-lo em um vinho que alega ser anterior a esses eventos é indício de fraude. E foi o que aconteceu...
Além disso, os investigadores de Bill Koch descobriram que só era possível reproduzir fielmente as letras inscritas na garrafa, usando ferramentas modernas que não poderiam ter existido no tempo de Thomas Jefferson.
A história é cheia de detalhes curiosos, mas é muito interessante ver que partículas atômicas ajudaram a resolver o mistério!
Para encerrar, se quiser ler sobre outros casos de fraude no mundo do vinho, clique aqui.
Seguir @tintosetantos Tweetar